Pré-História e primeiras civilizações
A primeira aula do curso História do Mundo Enquanto Fofoca
Começa hoje o curso História do Mundo Enquanto Fofoca.
Em nossa primeira aula, falaremos sobre a pré-história, e as primeiras civilizações: egípcia, mesopotâmica, hebraica. Abaixo, o roteiro da aula.
1 Introdução
Primeiro, vamos problematizar os conceitos de História, História Antiga, Pré-História e Ocidente.
O conceito de Antiguidade é inventado no Renascimento, em detrimento da época "média" que eles consideravam recém-terminada e em comparação ao presente onde esses valores ditos antigos seriam ou deveriam ser resgatados. Ou seja, inventa-se a Antiguidade para se poder criticar a Idade Média, ou inventa-se a Idade Média para se poder elogiar a Antiguidade.
A pré-história é inventada mais recentemente ainda, no final do século XIX. Até então, se pensava que a humanidade tinha menos de 6 mil anos. A ciência de final do século XIX inventa a noção de tempo longo, geológico, que temos hoje.
E o Ocidente, por fim, é essa convenção cultural que teria tido o seu começo na tal Antiguidade. Mas existe? Ou, melhor, faz sentido manter e ensinar essa convenção de tempos passados? Afinal, qual é o limite entre ensinar o cânone ocidental e mantê-lo à revelia de outros cânones? Ou seja, se concordamos que o cânone ocidental é uma invenção colonialista e redutora, por que não ensinar outros cânones?
O difícil equilíbrio desse curso será entre, em primeiro lugar, a necessidade de ensinar o cânone ocidental, pois são suas referências que estão em quase toda a cultura que consumimos, são nessas referências que precisamos ser fluentes para funcionar em nossa cultura, mas sem nunca esquecer, em segundo lugar, que o mundo é muito maior que esse autoproclamado ocidente, que havia muita coisa importante acontecendo por toda parte. (Um texto meu sobre o conceito de ocidente: Brasil, país ocidental?)
2 Pré-história
Depois, vamos falar sobre a pré-história. Nosso guia será Marshall Sahlins, em A sociedade afluente original, sobre o qual já escrevi. Também vou explicar como funciona a teoria da evolução (pois sem isso a própria evolução do ser humano não faz sentido) e a datação por carbono 14 (que explica como conseguimos datar tão precisamente esses artefatos).
Por falar em evolução, por que ovulamos tão discretamente e, depois, entramos na menopausa? Como essas características foram selecionadas? Por falar em “sociedade afluente original”, por que paramos de caçar e coletar e começamos a plantar, a dita Revolução Neolítica? Quais foram as vantagens e desvantagens desse movimento? (Não é à toa que no Livro do Gênese o responsável pela "Revolução neolítica" é Caim! Claramente nem mesmo no passado longínquo essa “revolução” era unanimemente celebrada.)
O foco principal será na mais espetacular invenção do ser humano pré-histórico: a língua. (Ao contrário do que muita gente pensa, a língua é a falada: o que chamamos de escrita é somente a tentativa de capturar graficamente algo que é muito maior, muito mais vivo, muito mais poderoso, muito mais orgânico.) Segundo as mais recentes pesquisas, a língua foi inventada, ou seja, selecionada pela evolução... para fofocar.
3 Primeiras civilizações
Na terceira parte, realizaremos um panorama das primeiras civilizações, egípcia e mesopotâmica, e também um pouco sobre a chinesa e indiana, com um foco em duas de suas mais espetaculares invenções: a cidade e a escrita.
Pra começar, como definir "civilização"? Será que não temos um ponto cego em relação às civilizações ditas não-arquitetônicas, ou seja, que não deixaram pirâmides ou grandes edifícios?
Uma diferença: no Egito, a unidade principal era o reino; na Mesopotâmia, as cidades. Por quê? Era o Egito uma dádiva do Nilo? Ou será esse somente um comentário preconceituoso dos gregos, precursor de tantos olhares preconceituosos do ocidente para os não-ocidentais? Qual era a importância simbólica das pirâmides e da divindade do Faraó para a ideia que os egípcios faziam de si mesmos? Ou seja, por que ter tanto trabalho para construir algo se esse algo não fosse fundamental?
Por que as primeiras cidades surgem na Mesopotâmia e no Egito, mas não em outros lugares que também tinham agricultura? (Essas regiões, para serem férteis, demandavam um esforço laboral coletivo que acaba engendrando cidades e reinos.) A importância do Código de Hamurábi, a primeira lei codificada, escrita, previsível.
Também falaremos da impacto da domesticação dos animais, em especial do cavalo, e também das primeiras técnicas de metalurgia. (Para essas primeiras civilizações, a Europa nada mais era do que uma fonte de recursos minerais extrativistas.)
A agricultura inventa a cidade e também a guerra: afinal, quem acumula precisa proteger o que acumulou. Mais do que tudo, a cidade estimula a troca e a interdependência. (Já a partir do ano 5.000 aEC existem evidências de intensas trocas comerciais na região.) Não é à toa que, até o colapso da virada do primeiro milênio para o segundo, o Mediterrâneo era uma região interconectada e cosmopolita.
4 Os hebreus
Por fim, vamos falar de um pequeno povo que teve um impacto desproporcional na história, e fazem a ponte entre todos esses grupos, entre o Oriente e o Ocidente: os hebreus vieram da Mesopotâmia (trazendo suas leis e seus mitos, como o nascimento de Moisés e o Grande Dilúvio), foram escravizados no Egito (adquirindo uma certa relutância contra reis e reinos, e talvez uma proto-consciência social), migraram para a Palestina e escreveram as histórias que, através do Cristianismo, formam a base da cultura dita Ocidental. O foco será, naturalmente, em sua espetacular invenção: a monoteísmo ético.
Se egípcios basearam sua civilização do reino e mesopotâmicos, na cidade, os hebreus criaram a sua quase sem Estado, a partir de sua religião, monoteísta, ética, única. Javé evolui de um Deus tribal e senhor dos exércitos para um Deus universal, ético, com consciência social. A Bíblia Hebraica, um dos monumentos da literatura humana, é a história desse processo, dessa evolução, que depois vai gerar outras religiões éticas monoteístas, como o Cristianismo e o Islamismo. O Deus de Abraão e Moisés já não é o Deus de Isaías e Jeremias, profetas que estão entre as primeiras figuras da humanidade a exigir justiça social. (A primeira aula do curso Introdução à Grande Conversa, sobre os livros do Gênese, Samuel e Jeremias, é toda sobre esse processo.)
5 A catástrofe
De repente, por volta da virada do segundo para o primeiro milênio antes da Era Comum, a civilização cosmopolita e integrada do Mediterrâneo parece sofrer um colapso sem precedentes: as redes de troca se desfazem, as sociedades se voltam pra dentro, a escrita é parcialmente esquecida. (Um livro recente localiza essa catástrofe em um ano específico, 1177 B.C.: The Year Civilization Collapsed, mas foi um processo que durou séculos.)
Nessa pequena Era das Trevas, nem tudo era tão trevoso, pois ela nos legou algumas das mais perfeitas obras literárias da História: não só grande parte da Bíblia Hebráica, mas também a Ilíada. (As duas primeiras aulas do meu curso Introdução à Grande Conversa mergulham fundo nessas obras, e eu recomendo.)
A segunda aula do curso História do Mundo Enquanto Fofoca, na terça, 25 de janeiro, será sobre o mundo mediterrâneo, entre o começo dessa pequena Era das Trevas e o surgimento do Cristianismo.
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A duração das aulas
No meu primeiro curso, Introdução à Grande Conversa, eu fazia um esforço hercúleo e doloroso em me manter no limite máximo de duas horas.
Mas, no contexto de uma aula em vídeo, onde a maior parte das pessoas alunas nem mesmo assiste ao vivo, esse esforço não faz sentido.
Então, agora, faço o contrário: na aula ao vivo, falo tudo o que acho relevante e interessante sobre o tema, sem limite de tempo, e ninguém precisa vir, todo mundo pode entrar no meio, sair no meio, entrar e sair, assistir como bem quiser, sintam-se livres. :)
Já as aulas gravadas, eu publico separadas por tópicos temáticos, para facilitar o acesso das pessoas alunas às partes que mais lhe interessam.
(O preço promocional só vai até o início do curso, HOJE!)
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História do Mundo Enquanto Fofoca
Um panorama da história mundial, com foco no Ocidente, desde a pré-história até a Queda do Muro de Berlim. 12 aulas semanais, terças das 19h às 21h, entre 18 de janeiro e 12 de abril de 2022. Sem leituras obrigatórias.