O mal é a falta de atenção
A distração que me faz esquecer não é o que me justifica: é o que me condena.
A distração que me faz esquecer não é o que me justifica: é o que me condena.
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Amiga falando do irmão com quem divide um apartamento:
“Ele é uma pessoa boa, linda, incrível, tolerante, generosa… mas não lava a louça! Sai da mesa e deixa a louça toda lá, como se ela fosse magicamente se lavar sozinha, e quem tem que lavar tudo sou eu! Depois de já ter cozinhado sozinha!”
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No nosso dia a dia, temos poucas oportunidades práticas de ativamente não-estuprar, não-roubar, não-torturar, não-cometer-genocídio. Não-matar não é uma decisão consciente que tomo todo dia e da qual posso ter orgulho. Somente não-estuprar não faz de mim uma pessoa boa.
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Mas e se o mal for a falta de atenção? Os olhos cegos e os ouvidos moucos? O egocentrismo e o autocentramento?
Talvez o mal seja um honesto pai de família que não enxerga nada a sua volta, que não vê a esposa insatisfeita e desesperada, as filhas confusas e autodestrutivas, a sócia abrindo a garrafa de uísque cada vez mais cedo.
O mal é arrancar Anne Frank do sotão, mas também pode ser cruzar todo dia pelo porteiro com o braço engessado e nunca perguntar, nunca se preocupar, nunca nem reparar.
O mal é ser dono de uma fazenda com duzentas pessoas escravizadas, mas também pode ser se opor a uma nova estação do metrô, porque vai destruir as arvorezinhas da sua praça e nunca te ocorrer das centenas de milhares de pessoas trabalhadoras que não têm carro, passam horas e horas em ônibus e terão suas vidas significativamente melhoradas por uma nova estação.
O mal é a Estrela da Morte destruindo Alderã, mas também pode ser eu relaxar do longo dia de trabalho curtindo um filme, depois de um belo jantar feito por minha irmã, e nunca me passar pela cabeça que ela teve um dia igualmente longo de trabalho, ainda por cima fez o jantar e agora está sozinha tirando a mesa e lavando a louça, e ainda perdendo a chance de ver o filme!
E se o mal for aquilo que sinceramente não me ocorre, que realmente não enxerguei, que juro que não ouvi, que não sei como fui esquecer?
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Eu poderia tentar argumentar:
“Foi mal, sou tão distraído, minha cabeça está cheia de problemas, não lembrei mesmo…”
Mas a distração que me faz esquecer não é o que me justifica: é o que me condena.
Gostaria de poder dizer que sou uma pessoa boa que tem péssima memória e é muito distraída. Mas não. Minha péssima memória e minha extrema distração são sintomas de meu profundo desinteresse por tudo que não diga respeito a mim.
Eu não esqueço os nomes das editoras com quem tenho que fazer networking, o dinheiro que emprestei para uma amiga, o endereço da nigeriana com quem flertei na praia..
Eu esqueço de lavar louça (“puxa, fiquei aqui distraído do filme, esqueci totalmente da louça, agora ela já lavou, amanhã ajudo!”), de assinar o livro de ouro dos porteiros (“putz, com essa correria de natal, nem lembrei, mas tudo bem, ano que vem dou em dobro!”), de responder o email da amiga que pediu minha ajuda (“caramba, essa mensagem está na minha caixa de entrada há três anos, ela já deve ter resolvido sozinha.”)
Mas não tem problema: na minha cabeça, sempre me absolvo. Afinal, sou o protagonista do filme da minha vida e tudo o que faço sempre se justifica.
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Somos maquininhas de inventar justificativas para os nossos comportamentos.
Quando fazemos tudo certo, o mundo precisa reconhecer isso e nos premiar — ou é muita injustiça! Quando agimos errado, é porque foi um lapso, uma fraqueza, uma exceção, e o mundo precisa reconhecer isso e nos entender — ou é muita injustiça!
De um modo ou de outro, julgamos as outras pessoas por suas ações, mas queremos ser julgadas por nossas intenções.
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Hoje em dia, penso o contrário: qualquer comportamento meu que precise ser justificado ou racionalizado já está por definição errado.
Mais ainda: talvez eu não seja uma pessoa boa.
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Então, o que é ser uma pessoa boa?
Ser uma pessoa boa é não é apenas ajudar minha irmã a lavar a louça.
Ser uma pessoa boa é tornar-me uma pessoa para quem seria intolerável sentar para assistir um filme enquanto minha irmã lava toda a louça sozinha.
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Trechinho do meu livro Atenção., que você pode comprar aqui.
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Me paga um café?
Se meus textos tiveram impacto em você, se minhas palavras te ajudaram em momentos difíceis, se usa meus argumentos para ganhar discussões, se minhas ideias adicionaram valor à sua vida, por favor, considere fazer uma contribuição do tamanho desse valor.
Assim, você estará me dando a possibilidade de criar novos textos, produzir novos argumentos, inventar novas ideias.
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Mecenato no Apoia-se
Meu espaço de mecenato no Apoia-se tem como objetivo:
Criar uma comunidade mais próxima, de encontros, de conversas, de vídeos;
Publicar textos mais pessoais, rascunhados, incipientes;
Testar primeiras versões de contos e romances;
Promover bate-papos mais livres no Whatsapp e no Zoom;
Compartilhar minhas leituras e meus interesses nas formas de aulas mensais;
Proporcionar um ambiente único onde estejam todos os meus cursos.
Vem comigo?
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Planos de mecenato
O plano básico, Mecenas TEXTOS (R$19), oferece textos exclusivos, mais pessoais, às vezes rascunhados, e também uma participação maior no meu processo de escritura, com acesso às primeiras versões dos meus textos ficcionais. Além disso, para quem gosta, rola um grupão de Whatsapp para conversarmos livremente todo dia, sobre qualquer coisa. Seu nome vai pra lista de mecenas (se quiser, claro) e você ganha descontos em tudo que eu fizer, cursos, eventos, etc.
O plano Mecenas NÃO-MONOGAMIA (R$39) é bem específico para as pessoas que vinham me pedindo por uma interlocução maior nesse assunto. Ele oferece, além de todas as vantagens do plano anterior, também um grupo de Whatsapp separado somente sobre não-monogamia, para que as pessoas interessadas possam fazer amizades e tirar dúvidas. Uma vez por mês (1º domingo, 17h), teremos um encontrão no Zoom para conversar mais e trocar experiências.
Recomendo o plano intermediário, Mecenas ENCONTROS (R$47), que tenta criar ainda mais espaços de intimidade e interação. Além das vantagens dos planos anteriores, ele inclui um encontro mensal (2ª quarta-feira do mês, 19h), uma conversa de boteco sem assunto definido, só para bater-papo, e também uma aula mensal (última quarta-feira do mês, 19h), sobre literatura ou história, cujo tema será avisado com antecedência, ambos pelo Zoom. É uma maneira de eu compartilhar os meus interesses e minhas leituras de cada mês.
Por fim, o plano mais abrangente, Mecenas CURSOS (R$88), dá acesso completo a todos os meus cursos online, passados e futuros, enquanto durar o seu apoio: Introdução à Grande Conversa: Um passeio pela história do Ocidente através da literatura (2020), Grande Conversa Brasileira: a ideia de Brasil na literatura (2021) e História do Mundo Enquanto Fofoca (2022), já completos, e os dois cursos ainda em andamento: Grande Conversa Espanhola: do El Cid ao Dom Quixote, a invenção da literatura moderna e Grande Conversa Fundadora: as obras que inventaram as línguas literárias modernas.
Para as pessoas que gostariam de ajudar um pouco mais, o plano Mecenas MIDAS (R$199) oferece literalmente tudo, por um preço um pouco mais generoso, com os meus eternos agradecimentos.
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Um grande beijo, e muito, muito obrigado,
Alex Castro