Elogio ao áudio de Whatsapp
Não é que as pessoas não gostam de "ouvir áudios no zap": elas não gostam é de ouvir pessoas.
Resisti muito ao Whatsapp: comecei a usar faz menos de dois anos.
Uma das coisas que mais gosto na ferramenta é justamente a possibilidade de mandar e receber áudios. Quase todo mundo, entretanto, odeia.
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Ok, se a pessoa me diz que "odeia ouvir áudios no Whatsapp", eu respeito.
Mas fico cá pensando:
Quando sua mãe faz um longo desabafo emotivo...
Quando a velhinha no ônibus engata uma história sobre como eram as coisas no seu tempo...
Essa pessoa gosta de ouvir?
Se a resposta é “não”, eu diria que o problema é mais com “ouvir outras pessoas” e menos com “áudios do Whatsapp”.
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Na verdade, o que me incomoda não é nem as pessoas não gostarem de "ouvir outras pessoas".
(Isso não surpreende ninguém.)
O que me incomoda é que as pessoas, usando os "áudios do zap" como espantalho conveniente, terem perdido a vergonha de admitir que não suportam ouvir umas às outras.
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As pessoas que odeiam áudio de Whatsapp geralmente não conseguem nem conceber porque eu gosto.
Aqui vai um exemplo bem prático.
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Ontem, fiquei chateado com a minha namorada.
Então, gravei um áudio no Whatsapp para lhe explicar como estava me sentindo.
Mas não gostei: não gostei das palavras, não gostei do tom, não gostei da abordagem. Desse jeito, pensei, ela vai se ofender, ela vai se blindar, ela vai se magoar.
Antes de enviar, joguei fora.
Gravei outro áudio.
Mesma coisa: falar aquelas palavras foi um certo desabafo, mas também foi uma certa dor. Não quero ser a pessoa que diz aquelas coisas. Não daquele jeito. Deve haver alguma maneira melhor, mais consciente, mais compassiva, de comunicar meus sentimentos.
Gravei, de novo e novo, um total de 27 minutos para, no final, mandar um áudio de menos de cinco.
Mas foi um áudio onde finalmente consegui verbalizar tudo o que estava me incomodando de maneira carinhosa e cuidadosa, respeitando os sentimentos e os limites da minha parceira, e dando origem a uma conversa bem frutífera entre nós dois.
Se eu tivesse falado aquelas palavras em pessoa ou por telefone, muito provavelmente teria dito palavras impensadas, descuidadas, levianas. Palavras que não teriam como ser desditas.
O Whatsapp me forneceu uma oportunidade preciosa:
Ao mesmo tempo em que eu ouvia as palavras que saíam da minha boca, eu também tinha a opção de, caso não gostasse delas, não enviar o áudio.
Só por essa possibilidade, eu já amaria essa ferramenta.
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Ou seja, para mim, a maior vantagem dos áudios do Whatsapp é, em conversas delicadas, podermos modular melhor o tom de voz.
(Sempre que acho que posso ser mal compreendido, ou que a outra pessoa pode achar que estou chateado com ela, mando áudio.)
Mas existe outras duas gigantescas vantagens:
Em primeiro lugar, o Whatsapp facilitou muito a troca de áudios sensuais, fetichistas, fantasiosos. Enquanto não inventarem um aplicativo que envie o cheiro ou o gosto da pessoa amada (que eu esteja vivo nesse dia!), a audição é o sentido mais atiçável à distância. Prefiro mil vezes um áudio safado do que a foto mais arreganhada.
E, por fim, mais importante, para muitas e muitas pessoas em um país pobre como o nosso, para quem escrever ainda é uma habilidade mantida de forma precária e difícil, enviar áudios é uma maneira de não apenas se comunicar com mais conforto, precisão e eficiência mas, também, principalmente, de evitar expor os erros de ortografia que cometeriam na escrita.
Então, desculpem, mas “odiar áudio no zap” é meio classista sim.
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Um dos temas principais do meu livro Atenção. é justamente que precisamos praticar menos oratória e mais escutatória. Já leu? Dá uma olhada. Tem impresso, ebook e até em áudio, narrado por mim.
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Um beijo,
do Alex